Não existem hospitais no espaço. O ambulatório mais próximo é na Terra, e os astronautas não podem simplesmente pedir um táxi para voltar pra cá. Então o que acontece se o Sol emitir uma quantidade massiva de radiação enquanto um astronauta passeia lentamente pelo espaço?
A Biocapsula da NASA – feita de nanotubos de carbono – será capaz de “diagnosticar” e tratar instantaneamente um astronauta sem que ele ou ela perceba que algo deu errado. Seria como ter seu próprio Dr. McCoy – implantado embaixo da sua pele. Isso representa um dos mais importantes avanços na história da medicina, e sim, isso irá funcionar na Terra também.
De todas as coisas maravilhosas que vimos durante nossas visitas à NASA, nada nos deixou tão loucos como esse pequeno pacote de carbono. A Divisão de Biociências do Espaço na NASA Ames cria tecnologia médica para astronautas. Eles basicamente fornecem tratamentos médicos para o espaço sideral. Dr. David Loftus é o cara que inventou a Biocapsula da NASA e conseguiu uma patente para isso.
Imagine isso: Um astronauta indo para Marte. A jornada irá levar entre dois e três anos. Durante esse tempo, o astronauta não terá acesso a um médico e muita coisa pode acontecer com o corpo humano no espaço. Então, antes do lançamento, implantam inúmeras biocápsulas da NASA no astronauta. Uma incisão bem pequena foi feita na pele do astronauta para cada Biocápsula (provavelmente na coxa), a qual é implantada embaixo da pele. É uma cirurgia ambulatorial que requer apenas anestesia local e um ponto ou dois para fechar a ferida. Mas depois que está completa, o corpo do astronauta está equipada para lidar sozinho com uma série de possíveis problemas.
Uma das maiores ameças no espaço é a exposição a níveis elevados de radiação. Quando astronautas viajam além da órbita baixa da Terra (ou seja, até à lua ou Marte), eles correm o risco de exposição à radição vinda de “eventos de partículas solares,” emissões repentinas de radiação intensa vinda do Sol, que pode danificar a medula óssea e acabar com o sistema imunológico de alguém. É aí que entram as Biocápsulas da NASA: Elas podem conter células que sentem os níveis elevados de radiação e automaticamente liberam medicamentos para ajudar o corpo a compensar.
Isso não é ficção científica. Nós hJá usamos um hormônio chamado G-CSF (fator estimulante de colônias de granulócitos) para tratar pacientes de câncer que estão recebendo tratamento de radiação. Então foi um passo bem pequeno colocar estas células em uma cápsula. Sem o G-CSF, o sistema imunológico de um astronauta poderia não se recuperar; ele ou ela poderia morrer de uma infecção generalizada.
As Biocápsulas não são de uso único. Cada cápsula pode ser capaz de fornecer várias doses pequenas ao longo de um período de vários anos. Não há “prazo de validade” para elas. Elas são extremamente resistentes, e atualmente não há nenhuma enzima conhecida capaz de quebrar suas nanoestruturas. E como as nanoestruturas são inertes, elas são extremamente bem toleradas pelo organismo. A natureza porosa da cápsula permite que a medicação passe por suas parede, mas a nanoestrutura é forte o suficiente para manter as células em um só lugar. Uma vez que todas as células se expandem, a Biocápsula permanece no corpo, estável e imperceptível, até que ela seja eventualmente removida por um médico na Terra.
Apesar do tratamento para efeitos da radiação ser o uso número 1 para a Biocápsula, diferentes cápsulas serão criadas para combater diferentes ameaças. Calor, exaustão, e muito tempo sem dormir são riscos sérios em um EVA (uma “caminhada pelo espaço”), e astronautas normalmente trabalham com uma agenda bem apertada. Diferentes cápsulas podem ser criadas contendo métodos de acionamento variados e tratamentos para inúmeros fatores de estresse. Naturalmente, DARPA expressou um enorme interesse nas Biocapsulas para possível uso militar. Mas existem muitas outras coisas planejadas para nós Terráqueos.
Em nosso planeta natal, o alvo principal das Biocapsulas da NASA é a diabetes – mais especificamente, pacientes que precisam de insulina Segundo o Dr. Loftus:
A cápsula iria conter células das ilhotas pancreáticas (de animais) ou então conter células modificadas para se comportarem como células das ilhotas pancreáticas, com as funções de percepção de glucose e secreção de insulina. Pacientes com uma necessidade baixa de insulina pode se beneficiar com o implante de uma única capsula (contendo talvez um milhão a até 10 milhões de células); pacientes com necessidade maior de insulina pode precisar de mais de uma cápsula.
Em outras palavras, pacientes diabéticos podem nunca mais precisar aplicar as injeções. Eles não teriam que se preocupar em lembrar de levar os medicamentos para qualquer lugar, e eles podem até estar livres de ter que monitorar constantemente o nível de açúcar no sangue. Além disso, muitos pacientes com diabetes entram em coma ou morrem enquanto dormem porque são oito horas todos os dias nas quais eles não podem monitorar os níveis de açúcar. As Biocápsulas da NASA seriam acionadas automaticamente, independente de você estar ou não acordado. Em 2010, estimava-se 285 milhões de pessoas vivendo com diabetes, então dizer que esta invenção poderia salvar milhões de vidas não é um exagero.
Aplicações “terrestres”secundárias incluem tratamento de câncer (especialmente câncer no cérebro). Uma Biocapsula implantada diretamente no leito tumoral pode fornecer altas doses de quimioterapia bem na área onde ela é necessária – e iria reduzir enormemente os efeitos colaterais ao minimizar a quantidade de medicação que chega às outras áreas do corpo. Também há usos importantes na terapia genética.
Algumas crianças nascem com um gene faltando, ou com um gene defeituoso. O resultado é que elas não podem produzir uma proteína necessária. Hemofilia é um exemplo clássico. Estes pacientes não tem uma importante proteína de coagulação do sangue. A Biocápsula pode ser usada para implantar células que são modificadas para liberar a proteína que está faltando. Um sucesso nessa terapia significaria que os pacientes seriam poupados de receber injeções periódicas. Os pacientes estariam protegidos pela proteína liberada pela cápsula, e eles seriam capazes de ter uma vida mais normal.
Durante nossa visita, nós perguntamos ao Dr. Loftus se haveria aplicações para quem sofre de alergias graves. Muitas pessoas tem alergias possivelmente mortais (a abelas, amêndoas, etc.) isso poderia fazê-los entrar em choque anafilático, e eles teria que carregar sempre uma seringa com adrenalina (uma “EpiPen”) em caso de exposição. Ele disse que isso era uma possibilidade bastante provável, e implementar essa tecnologia em uma Biocápsula seria relativamente simples. Ele até mesmo deu créditos para nós por termos dado a ideia, então se no futuro você for picado por uma abelha e não morrer agradeça ao Gizmodo.
Dadas todas estas aplicações (e ainda existem muitas outras), não é exagero dizer que a Biocápsula da NASA pode mudar a medicina para sempre. Eles são baratas e (como você pode ver no vídeo) extremamente fáceis de criar. O vácuo suga nanotubos de carbono em um molde, você tira a capsula do molde, enche com células e então tampa usando mais nanotubos ou uma cola de proteína. Fácil assim. Eles estão programando para começar os testes em animais esse ano, e os testes em humanos devem começar pouco tempo depois disso. Se tudo ocorrer bem, nós provavelmente veremos isso implantado em astronautas da Estação Espacial Internacional ainda nesta década, e apesar de ser sempre um chute, Dr. Loftus acredita que nós podemos realisticamente ver o uso difundido na Terra dentro de 10 a 15 anos.
A Biocápsula da NASA que eu fiz agora fica orgulhosamente exibida em uma prateleira acima da minha mesa. É provavelmente o objeto mais legal que eu já fiz. Um artefato do futuro. Toda vez que eu olho para ela eu sinto como se estivesse olhando através de uma janela para o futuro. Em vinte anos essas cápsulas podem ser algo comum. Todos nós poderemos tê-las sob nossa pele, para manter-nos seguros na Terra – ou talvez em Marte.
UPDATE: Eu entrei em contato com o Dr. Loftus com algumas das perguntas que fizeram nos comentários (do Gizmodo americano). Eis aqui mais alguns detalhes vindos diretamente da fonte.
Algumas pessoas perguntaram como as células são liberadas da cápsula:
“As células não são liberadas da cápsula. As células dentro da cápsula secretam moléculas terapêuticas (proteínas, peptídeos), e esses agentes saem da cápsula por difusão através da parede da cápsula.”
As pessoas perguntaram o que alimenta as células e como elas sobrevivem dentro da cápsula:
“A energia necessária para produzir as moléculas terapêuticas vem do próprio metabolismo das células. As células tem acesso à nutrientes que entram na cápsula por difusão (através dos poros da parede da cápsula), e estes nutrientes (incluindo oxigênio dissolvido) sustentam o metabolismo das células. A duração das células pode ir de meses até anos.
Eu o contatei com algumas outras perguntas, e irei atualizar se tiver mais informações.
Muito obrigado ao Dr. Loftus por ter dedicado tanto tempo a conversar conosco.
Space Camp fala sobre o lado pouco explorado da NASA. De robótica à medicina, de telescópios espaciais à arte. Nestas próximas semanas nós reportaremos a vocês diretamente da NASA JPL e NASA AMES, mostrando um pouco mais desse mundo fantástico. Você pode acompanhar a série completa aqui.
Vídeo gravado por Bill Bowles, editado por Woody Jang.
Agradecimentos especiais a Mark Rober, Jessica Culler, Dan Goods, Val Bunnell, e todos na NASA JPL e NASA Ames por tornar isto possível. A lista de agradecimento seria enorme, mas por nos conceder acesso, e por dedicar tanto tempo a conversar conosco, nós somos extremamente gratos a todos ali.
Via: gizmodo
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